sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Entrou no autocarro...

Entrou no autocarro. Sentou-se. Agitava-se, esfregava as mãos, abanava as pernas, sacudia o olhar. Na paragem seguinte, suspirou com tanta força que duvido que tenha sido ar o que expeliu; seja o que for, ficou no corredor do autocarro. Levantou-se num impulso, atravessou o autocarro a correr, a correr muito, e saíu pela porta da frente. Continuou a correr. Pensei que estivesse a fugir do que tinha expirado, certamente sabia que, fosse o que fosse, estava ali naquele corredor de autocarro, provavelmente a procurar nova vitima, entre os incautos passageiros, para trespassar: determinados estados de alma, são, tenho a certeza, perigosamente contagiosos, especialmente quando se sentem abandonados pelo portador. Na paragem seguinte, vi que já lá estava, voltou a entrar no autocarro, sentou-se no mesmo lugar. Nos braços: sossegou. Nas pernas: sossegou. Nos olhos: sosssegou. Pensei em replicar o exercício mas tenho a certeza que só ía perder o autocarro, nunca consegui contagiar as minhas pernas com a energia do meu pensamento.