Entrou
no autocarro. Sentou-se. Agitava-se, esfregava as mãos, abanava as
pernas, sacudia o olhar. Na paragem seguinte, suspirou com tanta força
que duvido que tenha sido ar o que expeliu; seja o que for, ficou no
corredor do autocarro. Levantou-se num impulso, atravessou o autocarro a
correr, a correr muito, e saíu pela porta da frente. Continuou a
correr. Pensei que estivesse a fugir do que tinha
expirado, certamente sabia que, fosse o que fosse, estava ali naquele
corredor de autocarro, provavelmente a procurar nova vitima, entre os
incautos passageiros, para trespassar: determinados estados de alma,
são, tenho a certeza, perigosamente contagiosos, especialmente quando se
sentem abandonados pelo portador. Na paragem seguinte, vi que já lá
estava, voltou a entrar no autocarro, sentou-se no mesmo lugar. Nos
braços: sossegou. Nas pernas: sossegou. Nos olhos: sosssegou. Pensei em
replicar o exercício mas tenho a certeza que só ía perder o autocarro,
nunca consegui contagiar as minhas pernas com a energia do meu
pensamento.